Faz hoje 1 ano que ocorreu o derby do título de 2016.
Faz hoje 1 ano que a humildade venceu a soberba.
Faz hoje 1 ano que escrevo o último jogo, aquele
que já não vimos.
A memória da integridade do que nos é passado é o
sinónimo da decência.
Quando naquele dia longínquo cheguei da escola tinha
uma bola de “catchu” vermelha e branca na minha cama, as cores que queria que
tivessem, não estavas lá porque tinhas o teu dever.
E saíamos quando éramos só 3 para rematar para ti
e queria ser o Diamantino e o Chalana, o Carlos Manuel e o Néné, tu trocavas e
mandavas-me ser o Bento e explicavas-me a força do Toni e o imperialismo do
Humberto Coelho, a mãe tricotava e eu sorria, era feliz. Uma infância feliz em
nós.
Quando fui à Luz antiga fomos juntos, mas as
memórias dos jogos eram feitas sempre depois.
Quando chorei após o penalty do Veloso não
estavas, eu queria que me abraçasses e me dissesses que era apenas futebol, mas
quando chegavas ele repetia, acabava por marcar e tudo começava novamente.
Quando o Vata empurrou a bola e os mais de 120 mil
a cabecearam, estava sozinho e eu explicava-te depois. O que tinha sentido e
como tinha sido, porque não estavas. Tinhas o sonho da família às costas no
trabalho.
Quando o César Brito marcou nas Antas, lá estavas
a trabalhar e eu descrevia como tinha sido, a chuva que caía, e tu explicavas a
cepa de que são feitos os beirões, nunca quebrar, nunca desistir. Não importa
como se começa, mas como se acaba. Não importa quão lento vais, mas que nunca
pares.
Quando do 6-3 gritava e corria sozinho, eu queria
que estivesses lá para discutirmos o João Pinto, a força do Isaías, e
descrevi-te tudo quando chegaste.
Crescia-me o benfiquismo exultante e tu amparavas-me
e descia-me a luz da razão e dizias que era só um jogo. Só um jogo e uma equipa
maravilhosa.
O benfiquismo realista e magnânimo. A glória está
em nós e no nosso dever na equipa.
Quando eu afirmava que com a eleição daquele cujo
nome não o digo nos encaminhava para a desgraça, tu dizias que se calhar tinha
razão, mas que por vezes também temos de escolher mal para sabermos decidir bem
no futuro.
Quando vi o Luisão a voar sobre o Ricardo estava
com o meu amigo para sempre ausente a festejar e quando cheguei a casa
contava-te tudo. E discutíamos e concordávamos e o Benfica éramos nós.
O Benfica sempre fomos nós.
Quando te levei à nova Luz com a outra luz dos
teus olhos, os nossos olhos tocavam-se e fazíamos a plenitude das gerações. Foi
imensamente feliz nesse dia.
Este “Benfica” em nós era maravilhoso, eu queria
sempre partilhar contigo quando não estavas, porque assim fazia mais sentido,
como aquele pai no “Locke” que no meio do turbilhão da vida continuava a falar
com o filho da vitória do seu clube de futebol e queria continuar a perpetuar
aquele momento.
Aquele último jogo não o vi nem tu o viste. Nunca
o veremos. Aquele último jogo seria especial – e acabou por o ser – não pela
vitória mas por eu estar contigo.
Tu estavas imóvel e eu imóvel estava contigo.
Nesse dia não houve derby mas levaste uma vitória. Ali.
Hoje um ano depois a espiral da vitória continua.
E eu continuo à tua espera, que chegue ao teu lado e te diga como foi. Melhor,
que à semelhança do ano passado pudesse estar a festejar comedidamente e a
sorrir a teu lado, porque esse era sempre o nosso desejo.
Agora aquele miúdo que se enchia de alegria quando
chegava a teu lado para te contar como o Benfica tinha ganho vai estar sempre à
espera, porque hoje compreendi que partilharei sempre a vitória quando olhar a infinidade
do momento.
Com saudade e orgulho, a integridade e o sorriso
que me ensinaste.
Hoje sofro na alegria.
Faz 1 ano que o Benfica venceu o derby. Faz 1 ano que nos deixaste.
Estamos bem, velhote…
Afinal ainda somos campeões!